segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Cabelos ao vento

 Lancaster, maio de 2009.

Lá fui eu hoje pela manhã em busca do curso de inglês, no centro da cidade. O céu estava azul e havia um terrível vento gelado que não deixava o sol aquecer nada nem ninguém. Peguei o ônibus na Universidade com meu return ticket - que dá um desconto considerável no bilhete. O ônibus seguia pelas ladeiras do caminho e ia parando a cada bus stop. Eu estava sentada bem na frente, perto do motorista, para que ele pudesse me avisar quando chegasse o meu lugar de destino. Notei que aquele banco onde eu estava  sentada era destinado a pessoas idosoas. Assim que o ônibus parou no primeiro ponto, entrou um velhinho. E, embora só eu estivesse no ônibus naquele momento, achei por bem deixar vago aquele banco e rapidamente pulei para um outro assento. Sábia decisão! O ônibus seguia, subindo e descendo ladeiras, e a cada parada mais e mais velhinhos entravam! Alguns se conheciam e diziam: Nice morning! Good to see you! Após algum tempo, resolvi fazer as contas:  havia 16 velhinhos no ônibus ! Eu e 16 velhinhos!! Eles eram bonitinhos, todos meio gordinhos, super agasalhados, cabelos de algodão completamente despenteados! Compreensível, já que fora do ônibus o vento soprava impiedoso e remexia furiosamente aqueles leves flocos de algodão que eles tinham na cabeça. Eu sabia que logo estaria na rua, com meus cinco fios de cabelos de Cebolinha arrepiados e embolados, já que o malvado vento não poupa ninguém, não faz distinções e a todos ataca! Pensei : estes velhinhos de cabelos de algodão são na verdade velhinhos de pelúcia que falam, conversam e têm vida! Só pode ser isso, eles são de pelúcia e eu devo estar fazendo parte de algum filme como Toy Story! Com esta certeza na cabeça, segui adiante, olhando a paisagem, ouvindo aqui e ali o que os velhinhos diziam. Chegou o lugar onde eu devia saltar, silenciosamente me despedi dos alegres velhinhos de pelúcia e entreguei ao vento os meus cinco fios de cabelo!
Entrei no lugar onde havia o curso de inglês: The White Cross Centre. Ali, no meio daqueles lindos prédios de tijolinhos, o vento era ainda mais forte. Coloquei um cachecol - indispensável nestes dias de alto verão! Quanto aos cabelos, larguei-os ao vento. Depois de andar para lá e para cá, entrando em prédios e saindo deles, finalmente cheguei ao Adult Centre Learning. Lá falei com uma jovem e simpática recepcionista que me informou que os cursos de inglès começarão em agosto! Ah, fiquei desolada! Mas, tudo bem, segui adiante, furei mais uma vez aquele vento e fui, sem nenhuma dúvida, por ele atacada e derrotada, já que minhas mãos congelavam e o meu nariz parecia não mais me pertencer. Resolvi dar umas voltas pelo centro da cidade e heroicamente segui até lá a pé. Andei um pouco e entrei numa loja para comprar shampoo. Sim, depois de tanto notar os cabelos voando, resolvi que era hora de comprar um bom shampoo! Entrei numa loja especializada nisso e uma atendente lançou um rapidissimo olhar para mim e logo me disse: Vocè precisa de um shampoo para cabelos finos! Olhei para ela, na dúvida: o que? é um eufemismo? tá me chamando de careca? E ela seguia falando, que tinha este shampoo que combinado com aquele mousse vai dar forma e volume ao cabelo. E eu: o que? então tá dizendo que eu estou descabelada? que meu cabelo  não tem volume? alguém fica penteado com este vento que sopra aí fora?? vão distribuir mousse para modelar os cabelos dos velhinhos também? hein? isso devia ser uma questão de política pública aqui!
No final das contas ela me convenceu: saí de lá com 3 produtos diferentes, tudo para cabelos finos, para dar volume, para dar forma! Não creio que nada disso vá vencer o efeito do vento, mas a atendente era boa vendedora e eu saí da loja realmente contente de ter feito aquilo por mim! Pensei que na próxima vez que eu entrar naquele filme de Toy Story vou avisar aos velhinhos de pelúcia que no centro  da cidade tem uma loja especializada em shampoos e que a atendente sabe dizer como combinar shampoos, mousses, cremes e mais uma infinidade de coisas que dão volume, ajeitam o cabelo, enfim, que superam de longe o poder desordenador do vento!
Peguei de volta o ônibus e voltei para a Universidade, subindo e descendo ladeiras, sentada num banco onde batia sol. Sigo o dia, me preparando para estudar, ouvindo o barulho do vento nas folhas das árvores.


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