domingo, 29 de novembro de 2015

Da série bichos em casa, ou melhor, bichos na ponta da língua

Desde criança convivi com bichos. Tive uma cachorra adorável, Loryn, pincher, miúda e amorosa. Mas além de Loryn, havia os bichos que encontrávamos nos acampamentos que fazíamos: sapos, cobras, passarinhos de toda a sorte, girinos, vaga-lumes, insetos e mais um monte deles! Minha família percorreu o Brasil por mais de dez anos, acampando, viajando de carro, uma variant amarela sem ar condicionado, sem direção hidráulica, cheia de amor, sonhos e bugigangas: o carro era abarrotado de coisas, literalmente, até o teto. Essa aventura gerou mil e uma histórias, delas falarei algum dia. Por ora, vou me dando conta de que os bichos em casa estavam também nas viagens e na ponta da língua. É, na ponta da língua. Com isso retomo a questão dos provérbios de que falei aqui. Como disse, o idioma que se falava em minha família era o dos provérbios e ditos populares. Havia, é claro, inúmeros provérbios que diziam respeito aos bichos, ou antes, aos bichos conosco, na nossa vida, enredados nos nossos modos de falar sobre as coisas mais triviais. Por exemplo, os últimos dias tem sido de chuva forte. Se minha mãe estivesse conosco, ela logo contaria a alguém que hoje choveu de cachorro beber água em pé. Imagine o tamanho dessa chuva? Cachorro bebeu água em pé! Quando meu filho nasceu, eu, como toda mãe, não sabia o que fazer com aquele garoto. Filho não tem manual de instrução não, a gente vai lidando com as situações no improviso. Muitas vezes me vi aflita com situações corriqueiras, como um soluço. Ai, gente, o garoto está com soluço! E agora? Minha mãe vinha logo com a resposta: fica calma minha filha, pé de galinha não mata pinto. A galinha era eu! Pronto, ficava uma galinha tranks tranks! Minha mãe estava sempre por perto. Em dias de muito calor, lembro que ela saía de casa, ia à padaria e comprava dois chicabons, o picolé preferido dela. Um, era para ela mesma, o outro, para o porteiro do prédio. Deixava com ele o picolé e dizia: comprei para você esse picolé porque hoje o calor está de matar passarinho desavisado! Ao conferir uma conta num restaurante, ela podia pegar um erro, um valor cobrado a mais, fazendo as contas rapidinho. E logo concluía: tem que ficar de olho na conta, ficar esperto, sabe como é, malandro é o gato que só come peixe e não vai na água. Isto é, o gato ali era ela, malandra, dava o golpe na malandragem de quem pretendia engana-la e nem precisava de máquina de calcular! Numa outra ocasião, em nossas viagens de acampamento pelo Brasil afora, o pneu de nosso carro furou no meio da estrada. Antes que pudéssemos alcançar o borracheiro para fazer o conserto, PIMBA!!! Furou outro pneu! Caramba, que azar! Na narrativa materna: urubu quando está com azar o debaixo caga no de cima! Que azar, o debaixo caga no de cima! Minha mãe também me ensinava a ser vaidosa, a cuidar das minhas roupas. Num olhar de soslaio para uma blusa mal passada que porventura eu usasse, ela mandava, sem dó nem piedade: vai aonde com essa roupa comida pela boca da vaca? O que era o fim da picada, a roupa devia estar mesmo um lixo total, uma blusa comida, ruminada, por uma vaca e vestida por mim! Minha nossa! Um espanto e uma rima, como disse, também havia a rima non sense: que horror, perereca de maiô! Aff! Perereca de maiô!! Ou ainda, para nos dar uma lição de desprendimento, conjugando provérbios: minha filha, não se aborrece não, vão-se os anéis ficam-se os dedos, dá para os outros as roupas que não usa mais, ficar guardando coisa que não usa é para jacaré egoísta. É, aprendi com ela que jacaré pode ser egoísta e que isso eu não devia ser não. A lista dos bichos na ponta da língua é interminável, havia inúmeros outros ditos com os bichos, filho de peixe ... , cão que ladra..., desse mato não sai..., cada macaco no seu ... ditos e mais ditos, ao infinito e além. E havia uma superstição que me faz ficar até hoje à espreita: minha mãe dizia que borboleta quando pousa na gente é sinal de dinheiro chegando! Sempre que vejo uma borboleta por perto fico no aguardo da grana. Resta-me como dúvida saber se mariposa pode ser considerada na categoria borboleta. A dúvida enraíza-se no fato de que em minha casa mariposas voam sem nenhuma cerimônia, voam deslocando o ar, quase fazendo barulho: chulapa, chulapa, chulapa! É a mariposa voando por aqui! Minha mãe foi embora desse mundo antes de me sanar essa dúvida. Será que, nos domínios da referida superstição, mariposa é borboleta? Se for, acho que vou enriquecer breve breve! Concluo esse post com uma foto: uma borboletinha na tela do computador! Esteve comigo durante toda a escrita, passou o dia inteiro aqui! Será que a miúda vale para fazer a dinheirama chegar?
[Imagem]
Descrição da imagem: uma minúscula borboletinha preta parada no monitor de computador, no qual é possível ver parte da página inicial do google. A borboletinha está de asas e antenas abertas. Suas antenas apontam para baixo, isto é, para a direção da base da tela do computador.

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